Eu estava na 5ª ou 6ª série, em meados dos anos 90. Curiosamente, lembro mais do sonho do que dos acontecimentos reais.
Naquela época, a internet ainda não era algo acessível ao público—muito menos para crianças. Computadores já existiam, sim, mas para mim era coisa de filme. Tudo era feito no papel.
Quando o professor passou um trabalho em grupo, fomos direto para a biblioteca da escola. Cada um escreveu sua parte à mão. E como eu era o único que tinha uma máquina de escrever em casa, fiquei responsável por datilografar tudo e entregar.
Tínhamos alguns dias de prazo. Mas, na primeira noite, não consegui encontrar os papéis. Revirei a mochila, olhei entre as páginas do livro—nada. O desespero bateu. Eu só pensava em como iria dizer para o grupo que teriam que refazer tudo.
Naquela noite, sonhei com esse momento. Eu tentava contar para eles que tinha perdido os trabalhos, mas não conseguia. Sempre que eu começava a falar, eles me interrompiam com brincadeiras, como se eu estivesse ali só pra divertir. Ninguém me ouvia. Eu, cada vez mais frustrado, até que no sonho enfiei a mão no bolso de trás da calça, puxei os papéis e joguei neles, dizendo que estava fora do grupo.
Acordei assustado.
Fui até o cesto de roupas sujas e peguei a calça que tinha usado na escola.
Havia um volume no bolso de trás.
Eram os papéis.
Engraçado como a memória funciona. Não lembro da nota que tiramos. Nem da reação do grupo, nem se eles souberam do sufoco. Mas lembro do sonho, como se tivesse sido uma mensagem do meu próprio inconsciente, tentando me dizer: “Calma. Tá tudo aí, só não tá no lugar que você esperava.”
Até hoje, de vez em quando, quando perco algo, paro, respiro… e lembro do bolso de trás da calça.