sexta-feira, 27 de maio de 2022

Dois loops na história (ou: Por que não deveríamos viajar no tempo)

LOOP 01


 23 de novembro de 1775.

 

Véspera da primeira grande batalha. As forças das colônias preparam para receber a investida de sua metrópole européia. O Grande General reúne seus comandados mais graduados, pesa as opções. A batalha que se seguiria iria definir os rumos da guerra. Se suas nações irmãs iriam se tornar independentes, se iriam rechaçar os estrangeiros que os oprimiram, escravizaram e roubaram suas terras.

Então sentinelas dão um breve alarme. A princípio parecia ser um espião, mas na verdade era um jornalista.


Do futuro.

 

257 anos no futuro para ser exato, da nação surgida a partir das colônias que se uniram para a guerra.


Sua tecnologia o permite entrar ileso no acampamento, mas sua postura pacífica deixa claro que não desejava fazer mal. Ele se apresenta como Lucas Arrelio. E declara que tinha conseguido inventar a máquina do tempo há poucas horas (relativo a ele). Seu desejo era apenas assistir àquela batalha, histórica em seu tempo. Prometia não alterar nada no desenrolar e desfecho.

O General pergunta então: “Ganharemos a Guerra?”

E o viajante diz: “Sim. A grande guerra que começará com a batalha de amanhã inspirará nossa nação. Triunfaremos contra uma força tida como superior. Nosso espírito indomável inspirará outros povos. O eixo do poder mudará para nosso continente, centrado na nossa nação. Isso me deu os meios para, daqui a 257 anos, eu inventar a máquina do tempo”.

O General gostou da resposta. Muitas de suas dúvidas estavam debeladas por aquele patrício de outro tempo.

A batalha começa no raiar do dia seguinte. As tropas chocam-se. A superioridade dos europeus era inegável, mas o presságio de Arrelio era inequívoco. O general marchou sem temer... Até que ficou claro que a batalha estava perdida.

O general recuou no último momento possível com o que pode angariar da armada original, certo que talvez fosse um primeiro movimento. O destino estava escrito, e seria inexorável. Talvez com a derrota na primeira batalha seria o elemento que desestabilizaria a metrópole se tornando convencida e vulnerável. Mas luta após luta, as forças coloniais perdiam.

Eventualmente o general foi capturado e marcado para a execução. Mas ele era o herói. O viajante do futuro disse. Mesmo enquanto esperava os tiros no paredão de fuzilamento, estava certo de que a história se corrigiria.

Com um grito de “FOGO!” tudo acabou.


Arrelio só anos depois percebeu que, por causa da “certeza” que venceria, o seu herói - o general que em seu passado relativístico triunfou e formou a mais importante nação de sua terra - tomou decisões temerárias. Com a certeza do desfecho, ele jamais calculou os riscos. Assumia que tudo acabaria bem porque assim o destino queria. E isso foi sua ruína, ao menos imediata.


A vontade de ferro e inabalável convicção do general, contudo, inspirou uma segunda revolta poucos anos depois. Esta nova revolta não estava nos livros de história do jovem Arrelio. A batalha foi bem mais longa e sangrenta, mas o viajante acompanhou com interesse. O general era o mártir que fez o levante ser convicto e assombrosamente competente. Arrelio já era homem velho quando a metrópole européia reconheceu que não tinha como quebrar o espírito da colônia e abandonou-a. E sua nação surgiu. Doze anos atrasada, mas enfim surgiu.


Arrelio jamais voltou a seu tempo. Viveu entre os primeiros cidadãos, e morreu como um misterioso e incompreendido observador do mundo.

Mas Arrelio renasceria mais de dois séculos depois. 257 anos após a primeira batalha ele estava estudando a sua máquina do tempo. Mas só a concluiria em 2043. 268 anos desde o encontro com o General. Chame de “destino”, chame de “coincidência”, mas este também foi o momento escolhido pelo Primeiro Viajante do Tempo nativo desta linha temporal para observar. A véspera da Grande Batalha da Independência.

...


LOOP 02


23 de novembro de 1775.

 

Véspera da primeira grande batalha. As forças das colônias preparam para receber a investida de sua metrópole européia. O Grande General reúne seus comandados mais graduados, pesa as opções. A batalha que se seguiria iria definir os rumos da guerra. Se suas nações irmãs iriam se tornar independentes, se iriam rechaçar os estrangeiros que os oprimiram, escravizaram e roubaram suas terras.

Então sentinelas dão um breve alarme. A princípio parecia ser um espião, mas na verdade era um jornalista.


Do futuro.

 

268 anos no futuro para ser exato, da nação surgida a partir das colônias que se uniram para a guerra.

Sua tecnologia o permite entrar incólume no acampamento, mas sua postura pacífica deixa claro que não desejava fazer mal. Ele se apresenta como Lucas Arrelio. E declara que tinha conseguido inventar a máquina do tempo há poucas horas (relativo a ele). Seu desejo era apenas assistir àquela batalha, histórica em seu tempo. Prometia não alterar nada no desenrolar e desfecho.

O General pergunta então: “Ganharemos a Guerra?”

E o viajante diz: “Não. Os eventos são vagos, mas sua inegável convicção garantiu que mesmo após a derrota, mesmo após seu fuzilamento, nosso patriotismo será moldado por seu exemplo, e na próxima guerra triunfaremos. Nosso espírito indomável inspirará outros povos. O eixo do poder mudará para nosso continente, centrado na nossa nação. Isso me deu os meios para, daqui a 268 anos, inventar a máquina do tempo”.

O General se espantou com a resposta. Muitas de suas dúvidas estavam debeladas por aquele patrício de outro tempo.

A batalha começa no raiar do dia seguinte. As tropas chocam-se. A superioridade dos europeus era inegável. Então, após testar suas forças, o General ordenou que recuassem, dando aquela vitória aos opressores, mas com mínimas baixas em seus comandados.

O destino estava escrito, e seria inexorável. O general começou a ponderar o que teria feito de errado, e duvidava de todas as suas decisões. E mesmo das dúvidas surgiam dúvidas. Sempre que surgia algum elemento complicador antes das suas forças encontrarem as européias, ele recuava. Deveria ser inteligente, ou ao menos era o que pensava.

Eventualmente o general estava prestes a ser capturado. Seria marcado para a execução, pelo que disse o viajante do futuro. No último momento, ele abandonou a farda e as medalhas, suas honras militares que o levaram ao comando das forças coloniais, e desapareceu na névoa da ignorância da história, sobre um disfarce tão humilhante e vergonhoso que mesmo se as forças européias o flagrassem, não reconheceria aquele que deveria ser seu mais temível inimigo.

A rebelião colonial foi massacrada. A metrópole destruiu todo e qualquer fagulha rebelde nas colônias. Arrelio que assistia a tudo estava crente que em determinado momento começaria o segundo movimento revoltoso, mas este nunca veio. Sua nação jamais surgiu, pois viram a grande guerra como um espasmo ineficaz de um covarde vaidoso. Quem se erguesse contra a metrópole européia seria massacrado, simples assim. O viajante não ousou voltar a seu tempo, pois não saberia o que esperar. Ele tinha tecnologia e meios para vier alheio a tudo. E assim ficou isolado até seus últimos dias de vida.

Anos, décadas... pelo menos dois séculos e meio se passaram. A metrópole escolhia mão-de-obra de sua antiga colônia, hoje um “protetorado” distante, mas igualmente explorado de suas riquezas a míngua dos nativos. Dentre estes, um jovem chamado Arrelio, com uma tese exótica que permitiria a viagem no Tempo. Mas ele era só um “colonozinho”. O que ele saberia? Jamais teve a oportunidade de estudar ou desenvolver suas teorias. Acabou em um emprego repetitivo e burocrático na grande engrenagem da metrópole, e nada mais.